Em A DANÇA, o trigésimo sexto documentário em mais quarenta anos de carreira, Frederick Wiseman leva a sua câmara para o faustoso e elegante Palais Garnier, em Paris, observando ensaios, reuniões de equipa e, finalmente, as performances de sete bailarinos, incluindo clássicos como o «Quebra-Nozes» e trabalhos de novos coreógrafos. Dizer que este filme, sumptuoso na sua duração e gracioso no seu ritmo, é um banquete para os apaixonados do bailado é afirmar o obvio e, além disso, é vender o filme de Wiseman abaixo da sua qualidade. Sim, este é um dos mais encantadores filmes sobre dança alguma vez realizados, mas é ainda mais do que isto. A sua maior virtude, a substância do génio particular de Wiseman, é a forma como nos transporta para as dinâmicas de trabalho de uma instituição, que de outra forma nem sequer nos interessaria. A observação de grupos de pessoas a trabalhar num espaço profissional claramente definido, ou num contexto social, tem sido o principal interesse de Wiseman desde o seu primeiro filme, TITCUT FOLLIES, que expôs os trabalhos de Bridgewater State Hospital destinado a criminosos com problemas psiquiátricos em Massachussets. The Paris Opera Ballet é um lugar obviamente mais agradável que o Boise Stathouse ou a penitenciária de New England – os dançarinos são certamente mais atractivos ao nosso olhar que os legisladores ou os assistentes sociais –, mas a qualidade de Wiseman mantém-se. A sua curiosidade é inabalável, mas também disciplinada, renunciando explicações a favor de uma versão visual. Em A DANÇA observa-se de perto como os bailarinos e os coreógrafos falham na tentativa de recriar movimentos complexos, num processo que é tedioso e totalmente absorvente. Embora todos os ensaios culminem numa performance de dançarinos produzidos, A DANÇA não tem de facto nenhum início, meio ou fim. É, por sua vez, sobre duas formas temporais que existem para lá da narrativa tradicional: o longo, o lento, o ciclo repetitivo, no qual existem as instituições, e os momentos exuberantes dos movimentos corporais e as expressões musicais que fazem do bailado uma forma de arte tão singular e elusiva. Tudo isto faz soar que o filme é remoto e até abstracto, mas é precisamente o oposto. Há personagens, eventos, e pequenos dramas que se desencadeiam na vida de uma companhia de bailado. Em A DANÇA, entre todas as observações, enfatiza-se a distância entre a análise verbal e o movimento físico. A dança é o veículo do significado e da emoção, mas é também um compromisso técnico que consiste no controlo dos movimentos musculares ao minuto. O que acontece num ensaio é a negociação entre a arte e a técnica, a linguagem é insignificante, embora seja um instrumento necessário.
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