Se tomarmos por base Raymond Williams e o Diccionario da lingua portugueza, o realismo na sua acepção anti-idealista é uma palavra do século XIX: passou a ser usada na França desde 1830, na Inglaterra a partir de 1850; e o primeiro registro no léxico de Antônio de Morais Silva data da edição de 1858. Desde então o próprio conceito, bem como sua aplicação literária ou crítica, teve seus altos e baixos, encarou contradições, envolveu polêmicas, prestou-se à designação de uma escola literária e conseguiu sobreviver a ela, ainda que muita vez tenha sido e continue a ser visto com desconfiança, como se fosse um bufão mentiroso ou um ardil sutilmente armado para apanhar incautos. Em um artigo inédito no Brasil e aqui agora publicado, o crítico inglês Ian Watt refere-se ironicamente a essas controvérsias como “desgastadas” ou “deterioradas”. O termo em inglês, “fly-blown”, sugere algo que foi deixado tanto tempo exposto que atraiu as moscas, serviu como matéria para que elas ali depositassem seus ovos – e possivelmente já vem sendo devorado pelas larvas que deles eclodiram. Estaríamos correndo o risco de trazer à luz, portanto, algo que, ao pé da letra, está virtualmente “bichado”? Se o perigo tem algum fundamento, as medidas para que não incorramos nele parecem bastante convincentes. No mesmo artigo, Watt mostra, por exemplo, que o velho e bom realismo como método geral de representação da realidade e como postura crítica está em excelente forma, sim senhor. Refletindo sobre seu aspecto mais amplo – isto é, não só ultrapassando por um lado a ideia da obra de arte como “espelho fiel” da sociedade e, por outro, o alcance de determinada escola literária oitocentista, mas também oferecendo a possibilidade de fixarmos melhor tanto este quanto aquele aspecto em sua especificidade e dinamismo históricos –, Watt defende uma crítica realista e uma atitude realista para com a literatura e as artes em geral como a melhor maneira de compreender a relação intrínseca entre arte e vida
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